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O Ouriço

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Estas linhas são a história do meu 25A de 40 anos atrás.

Um telefonema, cedo de Lisboa pôs-me ao corrente do que ninguém ainda sabia em Bula, pequena vila a 50 km a norte de Bissau sede do Batalhão de Cavalaria 8320.

Eu comandava a 2ª companhia (por ausência do capitão transferido para uma companhia africana) que estava em intervenção, depois de meses de ocupação da região de Nhamate, 20 Km a leste de Bula. (quando em 2006 visitei esta, região no âmbito de uma missão do Banco Mundial, onde fora o meu quartel sede da companhia, a selva tinha imposto a Paz. Apenas a peanha e o pau da bandeira restavam ainda numa pequena clareira como memória de tempos que muitos querem esquecer, mas a memória e história não deixa; do cimento dos tijolos e das chapas restavam sinais luxuriantes escondidos pela natureza).

Este ano fui com o meu filho André e os meus netos ao Terreiro do Paço na noite de 24 assistir ao espectáculo de som e luz que Lisboa ofereceu aos seus munícipes e visitantes.

O meu neto José Maria, 12 anos, não largou mais a boina que lhe trouxe de recordação desse passado de mais de 40 anos, que teimo em não esquecer.

O André já era nascido em 1974 "tenho pensado muito no André, para ele todas as hipóteses são de um Portugal melhor. Pela primeira vez tive a noção correta de que me poderia bater por uma coisa que o beneficiaria, principalmente a ele…." e, como acredito que se passa na esmagadora maioria das famílias portuguesas, ignora quase tudo sobre a guerra de África. Saberá sobre colonialismo, saberá sobre o Estado Novo, mas sobre nós que em Abril de 1974 ainda lá estávamos pesa um silêncio de que somos responsáveis.

Ainda este ano, estafadas as noticias e as polémicas que ano após ano se adivinham nesta data, com discursos mais ameaçadores ou eloquentes, mas nem a curiosidade jornalística chega para procurar informação sobre o que foram esses dias de promessa, confusão e informação para os que estavam a milhares de kms de Portugal.

Há muito que se começa a saber sobre os que tinham decidido viver lá e tiveram de voltar depois, mas os que só queriam voltar, o mais depressa possível, pouco ou nada se sabe.

"Foi vivido o dia 1 da revolução. Para mim que vagueei entre o mito e o sonho, entre os fatos e as hipóteses, foi um dia de cansaço mental e de certa desilusão….. estavamos só alferes (milicianos) e houve logo quem dissesse que vamos todos a Bissau e eu disse que bastava uma declaração de adesão. Depois do almoço tornei a insistir e afirmei que chegou o momento de ser coerente comigo mesmo e de passar das palavras aos atos; tudo o que queria saber era se tinha representatividade deles para pedir ao comandante para mandar o telegrama; que achava imperioso que se fizesse uma reunião de informação com os soldado,s pois eles não estavam a perceber nada e que toda a manhã me tinham feito perguntas do género 'agora que são os militares que mandam nós somos mais que os civis' ou 'agora vamos embora mais depressa'…"

São intermináveis as linhas que escrevi a 25, 26, 27 de Abril e por aí fora até 25 de Maio, dia em que voltei para Lisboa.

Quarenta anos depois na noite ainda fria de Lisboa no meio de uma multidão – quantos seriam apenas turistas – multilinguistica, um espectáculo tecnologicamente impossível de sonhar em 1974 aqueceu as almas com as recordações de sempre.

Agarrado à minha boina militar, o meu neto Zé Maria nem podia imaginar que as emoções que a música e a imagem nos faziam sentir, eram muito mais importantes que os factos históricos que eu e o André íamos sublinhando.

E no Domingo lá fomos à Assembleia da Republica para que os meus netos José Maria e António Maria, por momentos discursassem na sala das sessões e na sala do senado, como se falar livremente e dizer o que pensamos fosse a mais simples e mais natural das coisas.

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