Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

O Ouriço

MENU

BITOLA: BOIS OU BURROS?

Jack Soifer 18 Jul 12

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Durante dois anos li muito e entrevistei muitas pessoas para escrever o livro TRANSPORTES, com os engenheiros e professores Luís C. Silva, ex-engenheiro chefe da CP e António M. Aguiar, um dos diretores da TAP.


Fartei-me de rir quando li que a bitola (distância entre os carris) ibérica que nos foi imposta há 100 anos é diferente de todo o restante da Europa, era aquela de uma parelha de bois, que antes das locomotivas a vapor, puxava as carruagens em Espanha. Daí, enquanto na Europa a palavra é train, treno, zug, tåg, aqui ficámos pelo “com-bois” ou “com-boio”.


Há tempos foi elaborado um detalhado e mui económico Plano Integrado de Transportes, resumido no livro, que mostrava como em fases, mesmo com investimentos mínimos, se pode trazer a bitola Europeia, que já está a ser implantada em Espanha, até o porto de Sines, e na primeira etapa até Poceirão. Este foi entregue ao Ministro da Economia que deixou entender que iria assim facilitar as exportações diretas à França e Alemanha, sem transbordo em Espanha.

Mas, escreve o Luís Silva:

De acordo com uma carta ao Sr.Carlo Secchi, que mais parece ter sido escrita pela RAVE/Refer do que por um Ministro da Economia de Portugal, o nosso Governo abdica da bitola europeia e vai docilmente oferecer-se a Espanha para lá ser feita a transferência de mercadorias da nossa bitola para a europeia, que em breve chegará a Badajoz, mas que os nossos líderes não querem aproveitar, embora digam que estão fortemente empenhados numa ligação à Europa.  Com a mesma lógica desta carta, poderia trazer-se a bitola europeia de Badajoz/Caia até Évora, pelo menos, e já ficava pronta uma parte da futura linha e as operações de mudança entre bitolas seriam facturadas em Portugal e não em Espanha. Mas não será assim. A impreparação técnica de quem redigiu a carta vai ao ponto de, embora invocando as nossas dificuldades económicas, prometer equipar com o ERTMS a nova linha ibérica ou seja, equipá-la com um sofisticado sistema de controlo e segurança estudado para linhas interoperáveis, que não é o caso da bitola ibérica.”


Quem redigiu esta carta? Uma parelha de burros ou ao contrário, uma de exspertos vindos de um banco estrangeiro? Vai custar os mesmos 800 milhões do IVA que…Tratam-nos como a parvos e como só refilamos e nada fazemos, temos o que merecemos.

Diz o refrão dos AVANTES INOVANTES: “É pra mudar? Sim, sim, é pra mudar!!!”

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

6 comentários

De P.Porto a 19.07.2012 às 12:34

A coisa é mais simples: no MEE alguém percebeu que Sines ou Lisboa não são economicamente viáveis como plataforma exportadora para a Europa; portanto, investir em bitola europeia seria mais um erro de "planificação" económica a ser pago pelos do costume: nós.
Como se explica isto? Pelo facto de o custo unitário do km do transporte marítimo de longo curso ser (muito) mais baixo do que o custo unitário do km por via terrestre (rodovia ou ferrovia).
Na prática, ainda que houvesse bitola europeia de Lisboa a Irun, ninguém descarregaria mercadorias, qualquer mercadoria, em Sines ou Lisboa pra ser transportada 2, 3 ou 4 mil km por comboio para o centro da europa; é mais barato descarregar no Havre ou em Roterdão e distribuir por via terrestre a partir daí para a Alemanha e restante europa central. Como se isso não bastasse, a opção pelos grandes portos do centro da europa dispensa a canalização de recursos para investimento na construção de novas infraestuturas economicamente irracionais e funcionamente redundantes.

De Jack Soifer a 25.07.2012 às 19:55

Não conheço nenhuma Rede Ferroviária que calcula o frete apenas de um porto até um só destino. Se fosse assim o comboio poderia rodar 7 x 24h sem parar até o destino. Também não conheço nenhuma Rede Ferroviária que calcule o preço de grandes transportes por km. É uma composição de custos onde o km pesa pouco, mas transbordos, tipo de carga, rapidez na carga/descarga, peso total, são importantes.
A vantagem da bitola europeia é poder transportar não só de Sines , mas de muitas outras cidades intermédias ao longo da rota, não só para Madrid, mas para outras
cidades em Espanha ou no Centro de França. E destas para cá, pois, p.ex, muitas
das autopeças da AutoEuropa vem de lá e muitas das viaturas hoje exportadas poderiam, consoante afirmativa do seu Dir-Executivo, seguir pela CP, se a bitola
as levasse directo à França.
Sugiro ler o PLANO INTEGRADO DE TRANSPORTES, do engº e prof. Luís C Silva ou o
TRANSPORTES, dele +Prof. e Dir.da TAP António M.Aguiar +este autor, Jack Soifer.

De Luís C. Silva a 27.07.2012 às 18:17

A ferrovia de bitola europeia não se destina apenas às exportações. Como é óbvio, também embaratece as importações, seja de matérias primas necessárias às exportações (caso evidente da Autoeuropa), seja de produtos de consumo. A via rodoviária é mais cara, mais poluente e até já está a ser fortemente condicionada em alguns Países europeus. Devido à diferença de bitola entre a França (e estante Europa) e a península ibérica, os Pirinéus são atravessados diariamente por mais de 20.000 camiões pesados.
A sua ligação aos portos atlânticos é tão essencial como aos polos industriais.
A distribuição marítima não atinge o interior do continente europeu, sem ser à custa de transbordos, que encarecem fortemente o transporte.
O Livro Branco dos Transportes na UE, aprovado em 2011, é bem claro quanto à limitação do transporte rodoviário de mercadorias a um raio máximo da ordem dos 300 kms. Isto, porque os 2 modos de transporte energeticamente mais económicos são o marítimo e o ferroviário e a Europa, sendo energeticamente dependente do exterior, pretende reduzir significativamente essa dependência e a consequente saída de dvisas.
Uma rede ferroviária de bitola europeia (ou UIC), ligando a toda a Europa, serve ainda para vender serviços (portuários e transportes, por exemplo) e potencia a instalação de novas indústrias e serviços de valor acrescentado. Logo, melhora a economia, o emprego, etc.
LCS

De Renato Rodrigues a 15.10.2012 às 12:20

Mas segundo vi haviam problemas quanto à data da chegada da bitola europeia à fronteira. Quando acontecerá isso?

Outra questão que vi levantada tinha a ver com a incapacidade das linhas espanholas de AV, apesar de serem mistas, não suportarem contentores e granéis devido ao seu maior peso. Há algum fundamento técnico nisto?

Ainda outra dúvida levantada tinha a ver com possíveis entraves que os Espanhóis causassem à circulação de comboios de mercadorias num corredor espectavelmente bastante usado como nas próximidades de Madrid. Podem os Espanhóis limitar o nosso acesso à sua rede AV?

Muito obrigado por todo o trabalho realizado em prol dos transportes Portugueses

De Luís C. Silva a 19.10.2012 às 19:27

Prezado Renato Rodrigues,
As suas questões são bastante oportunas, pois circula muito "ruído" sobre este tema, em boa parte alimentado pela falta de atenção e de rigor que a comunicação social lhe tem dedicado. Assim, respondendo pela mesma ordem, teremos :
1 - A linha Madrid-Badajoz, em bitola europeia, faz parte do Projecto Prioritário 3 (PP3) das Redes Transeuropeias de Transportes (RTE-T). Foi projectada como linha de serviço misto (passageiros e mercadorias) e a sua plataforma, do lado espanhol, está quase toda concluída, tendo também já sido adjudicado o seu equipamento. Portanto, chegará à nossa fronteira muito antes da nossa Poceirão-Caia se concluir. Para não perderem os fundos comunitários, os Espanhóis deverão conclui-la até 2013, embora possa ser aceite um atrazo até mais 2 anos
Entre Madrid e a fronteira francesa, o troço do País basco, que é de serviço misto, está praticamente concluído e está agendada para 2013 a ligação à bitola europeia francesa, por Irun. Do lado mediterrânico, a bitola europeia já funciona entre o porto de Barcelona e França desde o ano passado, mas ainda há trabalhos a decorrer para a sua ligação à linha AV Madrid-Barcelona, com conclusão também agendada para 2013.
2 - A alegada incapacidade de algumas linhas espanholas de AV para o tráfego de mercadorias deve-se ao facto de terem troços com pendentes (inclinação) superiores aos 18 por mil, que são considerados para o tráfego de mercadorias. Tal nada tem a ver com a carga por eixo dos comboios de mercadorias, que, em regra, é bem bem inferior às 22,5 ton./eixo e a sua velocidade pouco excederá os 100 km/h. Contudo, tais linhas poderáo não dispor de desvios de 750 metros, para, em algumas estações, os comboios de mercadorias poderem dar passagem aos de passageiros, dificuldade que se resolve com novos investimentos, o mesmo se dizendo para o reforço da capacidade de tracção, para vencer as pendentes superiores a 18/1000.
3 - O tráfego de mercadorias do troço Poceirão-Caia evitará Madrid, contornando-a. O do troço Aveiro-Salamanca, que faz parte do Corredor Atlântico, já contemplado no quadro comunitário europeu de investimentos para o período 2014-2020, passará bem distante de Madrid. Cada km percorrido por um comboio dá lugar ao pagamento da respectiva "portagem" e isso certamente que interessa aos espanhóis. Poderá não lhes interessar a concorrência dos nossos principais portos, mas nesta matéria valerão as regras de mercado e os regulamentos da UE, que não anda a financiar obras nas redes transeuropeias para não virem a funcionar como tal ou para servirem para outros fins.
Creio que me alonguei um pouco, mas este tema ou é suficientemente explicado ou não faltarão mais "fontes de ruído". Por isso, lhe agradeço a oportunidade que me deu.
LCS

De Renato Rodrigues a 08.11.2012 às 11:27

Obrigado eu. É sempre bom aprender com quem sabe. Dei uma olhadela no seu contributo para um PIT e gostei bastante. Eu tenho interesse na matéria e estou a tentar converter a minha carreira para transportes e ferrovia. Se tiver algum link ou dica relevante agradeço. Quase todos as ofertas pedem experiência específica.

Comentar post

Pesquisar

Pesquisar no Blog

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

subscrever feeds